segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Scott Pilgrim vs The World (2010)

É uma tarefa complicada e um tanto ou quanto ingrata, esta de criticar. O preconceito que se leva quando se vai ver um filme é tanto, por vezes, que uma pessoa já sabe o que vai escrever antes de ver o mesmo. Esse preconceito pode surgir de inúmeras formas, seja por outras críticas, seja por amigos (que, por vezes, são quem nos influencia mais na nossa escrita), seja, caso o crítico se dedique a, ou se interesse por, actividades económicas, pelo lucro que o filme faz, seja pelos livros que inspiraram o filme que foram lidos antes do visionamento do filme. Acidentalmente li críticas (várias das quais apontava o filme como sendo o melhor do ano), ouvi amigos e li os livros, todos os seis volumes de uma das melhores bandas desenhadas que já li. E depois vi o lucro que o filme fez. E foi um fiasco. E é nessa altura que um crítico tem uma tarefa complicada - sem o ter visto, que juízo de valor tirar de um filme que deu prejuízo? Que conclusão pré-concebida tirar quando o melhor filme de 2010, para alguns, foi um fiasco de bilheteiras? E, nesse momento, desejei que o filme fosse mau. Porque se o filme fosse mau eu teria razões para regozijar o facto de ter sido um enorme insucesso de receitas. Mas não foi mau. E foi, realmente, um dos filmes de 2010.

Scott Pilgrim (Michael Cera), vinte e três anos, começa a namorar com uma rapariga de dezassete, Knives Chau (Ellen Wong), para grande deleite dos seus colegas de banda, Kim Pine (Alison Pill) e Stephen Stills (Mark Webber), mas também do seu companheiro de apartamento gay e extremamente porreiro, Wallace Wells (Kieran Culkin). Desenvolve-se mais um pouco da história, até que Scott fica apaixonado por uma outra rapariga, Ramona Flowers (Mary Elizabeth Winstead). Esta prontamente lhe revela que, para ficarem juntos, ele tem de derrotar os seus Sete Ex Malvados, que incluem um indiano ao estilo dos filmes de Bollywood (Satya Bhabha), um vegan com poderes especiais - por ser vegan, entenda-se - (Brandon Routh), uma ninja lésbica (Mae Whitman) e, claro, um génio do mal (Jason Schwartzman). Isto tudo, enquanto evita ao máximo o contacto - inevitável - com a sua própria "Ex Malvada" - "Envy" Adams (Brie Larson).

O Óscar certamente que não ganhará - há filmes mais pretensiosos para isso. Que, no fundo, não passam disso, filmes pretensiosos sem grande substância. Há dois Óscares que eram mais que merecidos para este filme, se não o de Melhor Filme: o de Melhores Efeitos Visuais e o de Melhor Actor Secundário, para Kieran Culkin. Quer numa categoria quer na outra a genialidade que é impressa é demais para ser descrita. De resto, é um filme que é tudo menos banal. A realização, aliada aos efeitos visuais e à fotografia, é brilhante. A banda sonora - constituida, em parte, de músicas dos próprios livros - é um deleite. A actuação por parte destes teen actors é, quiçá, o melhor acrescento nos seus curricula. E este é, na globalidade, o melhor filme que vi em 2010 (quase a acabar, mas ainda o vi nesse ano!).

Genial. E é só. 98%

domingo, 9 de janeiro de 2011

Get Real (1998)

Não é preciso haver um grande realizador, um grande elenco, uma grande banda sonora original ou uma fotografia por aí além para haver um bom filme. Este filme não tem nada disso. Um realizador praticamente desconhecido pega num elenco com características peculiares, numa banda sonora banal e numa fotografia que não tem nada de novo, mais uma história de amor, dir-se-ia cliché, ao estilo de filme para adolescentes. Mas é muito mais que isso. É uma história de aceitação, de amor proibido entre duas pessoas, de passos a tomar, mas também da adolescência, de dúvidas, de confissões e de certezas. Há muito para amar neste filme e eu amei-o.

Um rapaz sente subitamente uma atracção irreprimível por outra pessoa, depois de uma espécie de 'caçada aleatória' feita numa casa-de-banho pública. É tudo muito complicado: a pessoa em questão já é comprometida, pertence a um círculo de amigos completamente diferente e não aceita muito bem a sua própria atracção pelo rapaz, Steven Carter (Ben Silverstone). Ah, e é outro rapaz essa pessoa em questão. Steven é gay e apenas a sua melhor amiga, Linda (Charlotte Brittain) o sabe e da sua atracção pelo outro rapaz, atlético, popular e bonito, John Dixon (Brad Gorton), e posterior relação proibida. Claro que o próprio Steven também é atraente e, apesar de violentado fisica e psicologicamente, tenta manter-se forte e, ao mesmo tempo que esconde a sua orientação sexual do mundo, tenta que John se aceite a si próprio e a ele. O desfecho de toda a trama é uma cena que começa por ser violenta, onde John tenta esconder-se a todo o custo dos amigos, mas que acaba de forma emocionante e com um excelente 'atar de nós' por parte de todas as personagens, umas melhor, outras piores.

É um filme onde toda a gente, sejam gays ou bissexuais ou heterossexuais, sejam pretos ou brancos ou chineses, sejam de que minoria forem ou da maioria discutivelmente "normal", toda a gente se sente identificada com problemas e inadaptações sociais das personagens. É um filme que não é grande - nem parece ter pretensões disso -, mas é um filme crítico que me tocou bastante. É crítico contra o conservadorismo bacoco, irrealista e religioso de alguns sectores da sociedade e avança valentemente contra, sobretudo, a homofobia primitiva e irracional que impera no colégio privado onde os principais "Romeu e Romeu" andam. É um filme que, a ter alguma pretenção, é a da aceitação de todos os que, como Steven ou John, têm medo de se mostrar ao mundo nas suas verdadeiras cores e de esperar tolerância por parte dos que rodeiam. No que, na realidade, nem é visto como um 'problema' neste filme: afinal, não passam de sentimentos de uma pessoa por outra. E somos todos pessoas.

Por tanto me ter tocado o quanto me tocou e me ter proporcionado aquelas que foram umas quase duas horas bastante boas, dou a este filme uma pontuação de 86%.

Harry Potter and the Deadly Hallows - Part 1 (2010)

O melhor filme da saga? Certamente que sim. Toda a magia do livro, todo aquele mundo que nos transporta lá para dentro e nos faz sentir que somos nós que estamos no lugar do Mr. Potter, tudo isso e mais o que todo o leitor imagina é perfeitamente transposto para este filme. A saga Harry Potter encontrou em David Yates o realizador perfeito para o tom de todos os livros. Só é pena que o tenha encontrado só a partir do quinto...

Nada do que é importante da primeira metade do livro homónimo da escritora inglesa J. K. Rowling é deixado para trás (ao contrário do que aconteceu com outras peças cinematográficas desta destemida saga). Muito pelo contrário, David Yates enquanto realizador conseguiu seleccionar o sumo dos livros, extraí-lo e, quiçá, melhorá-lo. Numa história cativante (que começa logo com uma cena, para mim, fantasticamente enternecedora entre Hermione - Emma Watson - e os seus pais), onde Harry Potter (Daniel Radcliff), Ronald Weasley (Rupert Grint) e Hermione Granger vão testar não só a sua força e a sua magia enquanto feiticeiros, mas também a sua amizade, sentimentos e emoções enquanto indivíduos e enquanto unidade são manifestamente testados ao longo do argumento excelsamente adaptado por Steve Kloves. Da história há pouco para dizer, sendo impossível de revelar muita coisa sem cair no erro de revelar a um espectador/leitor um dos deus ex machina que até se encontram ao longo do filme...

A realização, aliada à fotografia e à sonoplastia, está soberba. Não é de estranhar, dados os dois filmes anteriores - também de Yates -, a beleza com que a história nos é contada, nem tão-pouco a perfeição impressa a cada frame que passa. Da interpretação, nada a apontar. Talvez o ponto mais fraco do filme, mas observando em retrospectiva, nota-se que há uma evolução extremamente favorável dos três actores principais, bem como uma reafirmação de poder artístico de alguns pesos-pesados do mundo do espectáculo.